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O COVEIRO E O ANÃO / Pedro Luiz Pereira

Naquela manhã de sol, como sempre, o coveiro Boris esbarrou em dona Carmen. Toda manhã, ao abrir o cemitério, lá estava a velhinha, arqueada e com seu regador. Na cabeça, sempre, o lenço negro. De certa forma, Boris admirava a obstinação da velha, que não se deixava intimidar nem mesmo pelo calor do sol. Ao entrar no cemitério, o ritual era sempre o mesmo: “Bom dia, seo Boris”, e seguia com seu regador até a torneira instalada ao pé do cruzeiro.

Enchia vagarosamente o regador e molhava primeiramente os canteiros de flores que rodeavam os túmulos dos gêmeos, da velha Carolina e finalmente do padre Gouveia. Em seguida, dirigia-se ao túmulo do neto, onde, depois de regar as flores ao pé do túmulo, ajoelhava-se e orava por muito tempo. À noite, se houvesse velório na capela do cemitério, lá estava ela, com seu já conhecido lenço negro na cabeça e entre os braços um maço de flores. De longe, já quase desaparecendo por entre os túmulos, dona Carmen acenou. Como podia uma mulher com aquela idade ter tanta energia?, pensou Boris. E mais ainda: tanta devoção pelos mortos? E veio a Boris a lembrança de uma confidência feita um dia pela velha: “Sabe, seo Boris, enquanto viver, não deixo este abençoado cemitério. Aqui está meu neto e ao lado dele quero ser enterrada!”.

É com orgulho que apresentamos o quarto livro de Pedro Luiz Pereira, jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP). Em sua carreira profissional, trabalhou nos jornais O Estado de S. Paulo e Diário do Comércio e Indústria. Escreveu, ainda, crônicas no extinto jornal paulistano Notícias Populares, além de participar de várias antologias de contos. Sempre surpreendendo o leitor com temas originais, como pode ser constatado nos livros Pauliceia das paixões, O tarado do Brás (vencedor do Prêmio Nacional Clube do Livro de Literatura) e, finalmente, no livro infantojuvenil Além daquela porta, apresenta-nos agora Pedro Luiz Pereira seu novo livro: O coveiro e o anão.

Através do coveiro Boris e do anão Vadinho, principais personagens deste surpreendente livro, o leitor é levado a conhecer os segredos de um universo fechado em si mesmo, um universo que chega mesmo a ser perturbador. Boris e Vadinho, cúmplices em suas dores, frustrações e ainda em seus sonhos desfeitos, irão comover o leitor. O cenário é um cemitério. Nele nasceu e sempre viveu Boris, recluso e isolado do mundo. Ali, convive Boris com a dor alheia. Tudo sabe Boris sobre o cemitério. Conhece de cor cada morto e cada túmulo. Dos visitantes, tudo sabe. Na memória de Boris, sempre, a lembrança da menina Rebeca que todos os domingos deposita um maço de flores no túmulo do pai. A Rebeca que um domingo encarou Boris e lamentou, num tom triste e melancólico: “Seo Boris, tenho tantas saudades de meu pai!”.

No cemitério, divide Boris a vida com Vadinho, personagem complexo; assassino frio, é às vezes terno como uma criança. Extensão um do outro, sofrem os dois por um amor impossível. Boris por Rosalia, enterrada ali no cemitério há muitos anos. Na cidade, o coveiro amaldiçoado por seu amor obssessivo a uma morta. Vadinho, por sua vez, inconformado com o casamento de seu grande amor, procura conforto em Boris. Resumindo todo o desencanto dos dois personagens com a vida, é de Vadinho o desabafo melancólico: “É, seo Boris, é numa noite como essa que Vadinho tem vontade de morrer!”.

Serviço:

O Coveiro e o Anão
Pedro Luiz Pereira

Scortecci Editora
Ficção
ISBN 978-85-366-4576-6
Formato 14 x 21 cm 
144 páginas
1ª edição - 2016

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